Quase uma medalha

Os jogos olímpicos de Paris 2024 estão a decorrer neste momento e há algo em que tenho pensado bastante, aqueles atletas que não ganham.

Os que não ganham são muito mais do que aqueles que ganham.

Por exemplo, nos 100 metros masculinos, estavam inscritos 46 atletas, dos quais 8 chegaram à final.

Desses 8, 3 ganharam medalhas, e apenas 1 foi o vencedor, a medalha de ouro.

Noah Lyles foi o vencedor, seguido de Kishane Thompson, e em terceiro lugar Fred Kerley.

A principal questão que me levou a falar desta final em específico é o facto de a diferença entre medalha de ouro e medalha de prata ter sido 5 milésimos de segundo. Repito, 5 milésimos de segundo.

Entre primeiro e terceiro foram 2 centésimos, e entre primeiro e último foram 12 centésimos.

Será que Oblique Seville, que ficou em último, treinou muito menos ou pior do que o Noah Lyles?

Quando falamos em desportos como a velocidade no atletismo, ou a natação, a distância de um cabelo pode ser a diferença entre ouro e nem receber medalha.

Se um atleta basear o seu valor em alcançar a medalha, a maioria dos atletas sairão destroçados do seu objectivo olímpico de vencer.

Acredito também que muitos dos atletas não têm aspirações de voltar dos jogos olímpicos de medalha ao peito, mas a partir do momento em que se qualificam, poderão sonhar com esse momento.

Nós os espectadores, vamos ouvindo os comentadores falar das marcas do ano, dos recordes pessoais, e começamos a separar quem acreditamos ser candidato ao título e os que não terão grandes hipóteses.

Mas quando falamos de diferenças tão pequenas, não será legítimo contar com todos para serem vencedores?

O Noah Lyles, que já falei num post anterior, acredita que pode fazer milagres, mesmo sem ser perfeito, e aquilo que também tenho visto ao longo destes jogos é que a confiança que um atleta tem em vencer influencia a forma como aborda a corrida e dessa forma pode influenciar o modo como está focado em dar o seu máximo e arriscar ser medalha de ouro.

Nas nossas vidas, por vezes esquecemo-nos de encarar a possibilidade de vencer, há momentos em que as coisas não estão a correr como o esperado e passamos a duvidar se alguma vez iremos alcançar a nossa medalha de ouro ( o que quer que seja para cada um).

Nem tudo é sobre vencer

O atleta que fica em segundo, e o atleta que ficam em quarto lugar, ambos têm lugares mais complicados de gerir, um não venceu, e o outro não alcançou o pódio, caso o trabalho psicológico de base não seja feito.

Quem sou eu se ganhar?

Quem sou eu se perder?

Idealmente, a resposta deveria ser a mesma, a pessoa que se esforça por alcançar um objectivo teve de desenvolver capacidades que a tornaram mais capaz de alcançar aquilo que se propôs, quer ganhe, quer perca.

Um jovem atleta que sonha ser atleta olímpico pode não o conseguir no seu primeiro ciclo olímpico, por vezes podem passar muitos anos até alcançar o nível necessário, mas não terá valido a pena da mesma forma?

Qual o caminho seguido se desistirmos?

Por vezes é cedo demais

Katie Hoff, nadadora americana com três medalhas olímpicas, vários títulos e recordes mundiais, foi aos seus primeiros jogos com 15 anos, em Atenas 2004.

Entre outras coisas, falou de ter sido vítima de bullying por parte de atletas da comitiva americana, mas o que mais me marcou na sua entrevista foi a forma como descreveu a sua incapacidade de usufruir da experiência de ser uma atleta olímpica.

“Sempre vi a questão como ter de ser medalha de ouro, ou então não é nenhum feito.”

Katie Hoff

Tudo ou nada é uma mentalidade que causa sofrimento e leva a perda de motivação.

Como também disse na entrevista, levou 16 anos a sarar de ter sido atleta olímpica, em dar valor àquilo que conseguiu, em conseguir encontrar valor próprio para além das medalhas.

Mais do que as medalhas

Para atletas, pais, e treinadores, é fundamental ter a consciência da experiência que o desporto pode dar a cada um de nós, valorizar o que se melhora como ser humano que vai para além de melhores tempos e medalhas no pescoço.

As diferenças são cada vez mais pequenas, nem todos vão ser medalha de ouro, mas todos podem sair melhores pessoas por se terem esforçado por alcançar algo que é importante para si.

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